Propriedade Intelectual na Internet, em educação e especificamente em EaD, é um tema fascinante (apesar de bastante complexo), que todos nós temos muita vontade (e necessidade) de conhecer, mas que em geral não é tratado em textos sobre EaD. Por isso mesmo, eu e a Carmem Maia dedicamos um capítulo especial para o tema no nosso ABC da EaD, pelo que inclusive tenho recebido vários emails e mensagens, agradecendo e elogiando nossa iniciativa, e que inclusive foi uma das aulas consideradas mais importantes pelos alunos no curso ABC da EaD no SL, cuja segunda versão começará em 14/04 – logo publico por aqui as informações completas. A palestra de Aline Sueli de Salles Santos e Graziela Tavares de Souza Reis, no Congresso da ABED de 2007, “Por uma Política de Direitos Autorais para a EAD”, foi das que teve mais público em todo o evento.
Eis aqui um caso importantíssimo, ligado a esse tema geral de Propriedade Intelectual em EaD.
Um dos primeiros posts deste blog foi A Patente do Blackboard de Sistema para EaD, ainda em 2006, sobre o processo movido pela empresa americana Blackboard contra a canadense Desire2Lean, logo depois que a empresa americana teve uma patente concedida para seu software. O processo defendia que a Desire2Learng teria infringido diversos pontos da patente 6,988,138.
Em um comentário ao post, eu fiz menção à página Board of Directors Meeting Minutes – October 8, 2006, Dallas, Texas, com informações de uma reunião de Diretoria da Educause (08/10/2006) em que, dentre outros assuntos, foram discutidas a patente do Blackboard e as reações negativas da comunidade acadêmica em relação ao processo movido contra a Desire2Learn.
A Blackboard, por sua vez, comprometeu-se a não usar a patente contra softwares caseiros ou de código aberto, desde que eles não se misturem a softwares proprietários. Leia informações sobre essa posição numa página de FAQs da empresa americana.
Quase 2 anos depois, temos 2 resultados interessantes e contraditórios, quase simultâneos, para aumentar a confusão.
Em primeiro lugar, a Blackboard ganhou há poucas semanas (11/03/2008) o processo contra a Desire2Learn. O tribunal federal de Lufkin (Texas) considerou a patente do Blackboard válida, e determinou que a empresa norte-americana deve receber aproximadamente US$ 3,265,633.00 de prejuízos (isso mesmo, mais de 3 milhões de dólares!). Com esse dinheiro, por aqui, nós montaríamos um sistema campeão! A Desire2Learn também não pode vender seu software nos Estados Unidos, mas a Blackboard promete não perturbar quem já utilizava o software canadense. É muito provável que a Desire2Learn apele da decisão.
Entretanto, algumas semanas depois (na semana passada, 25/03/2008), o departamento de marcas e patentes dos Estados Unidos (USPTO) considerou a patente do Blackboard inválida, depois de a ter reexaminado a pedido da Sakai, Moodle e ATutor. A decisão ainda não é final.
Quem quiser se enfronhar na discussão jurídica, tem bastante coisa para se divertir nos inúmeros links numa página da Desire2Learn. A empresa canadense mantém também um blog dedicado apenas ao tema.
O Campus Technology (que aliás só agora acrescentei nos meus feeds do Netvibes) publicou um longo artigo, Blackboard Vows To Press On, sobre a confusão toda.
Temos a obrigação de acompanhar essa briga, e discuti-la bastante, porque é muito provável que ela se torne referência para decisões sobre o campo tão movediço da Propriedade Intelectual em Educação a Distância nos próximos anos, ou mesmo que se transforme em jurisprudência. O que pode acontecer com as universidades que não usam o software da Blackboard?
Mas não se trata apenas de uma briga jurídica que pode definir as relações de Propriedade Intelectual em EaD para os próximos anos: trata-se também de uma interessante discussão filosófica, de um embate entre (a) o direito à liberdade de informação (ainda mais essencial em educação), de um lado, e (b) a proteção à propriedade intelectual (com a qual supostamente toda a sociedade sairia ganhando, já que funcionaria como incentivo para inventores). Embate que encontrou seu palco ideal na Internet. O próprio órgão de patentes norte-americano reconhece que o caso envolve questões novas sobre patentes. Tema que discuto em detalhes no meu Filosofia da Computação e da Informação, que ainda está no forno para ser publicado – estou ainda negociando um acordo interessante para o livro com mais de uma editora, pois é um livro especial.
Vou atualizando os próximos capítulos por aqui, e gostaria também de ouvir as opiniões de vocês sobre o caso.