O Dualismo de Descartes

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Descartes se tornou o bode expiatório da Filosofia. Muita gente que não chegou a ler sequer uma linha do filósofo francês, repete as acusações de racionalista e dualista, como se ele tivesse determinado a falência do nosso pensamento. Andei relendo as Meditações e as Paixões.

Racionalista? Se com isso queremos dizer que o pensamento é a primeira certeza a que ele chega, com seu método das dúvidas, ok, está correto. Se com isso queremos dizer que ele defende a liberdade de o ser humano resolver seus problemas utilizando a razão, e não mais apenas a fé e a autoridade, como vinha acontecendo há 1.000 anos em nossa civilização, também está correto. Mas Descartes não defende que o ser humano é apenas razão. Ao contrário, fala (e muito) de nosso corpo, e inclusive, de uma maneira muito bonita e interessante, de várias de nossas paixões, como admiração, amor, ódio, alegria, tristeza, desejo, desprezo, orgulho etc.

Dualista? Se com isso se quer dizer que Descartes defende que corpo e alma possuem características distintas, que não se podem reduzir os fenômenos psíquicos ao comportamento físico de nosso corpo, está correto. Mas é necessário descontar as imperfeições do conhecimento médico da época, assim como o fato de estarmos saindo da Idade Média, onde nem à mente nem ao corpo era dada a devida importância. E o próprio Descartes afirma que alma e corpo estão unidos e misturados no homem:

“A natureza me ensina, também, por esses sentimentos de dor, fome, sede etc., que não somente estou alojado em meu corpo, como um piloto em seu navio, mas que, além disso, lhe estou conjugado muito estreitamente e de tal modo confundido e misturado, que componho com ele um único todo.” (Meditações)

É preciso tomar cuidado, muito cuidado, com as caricaturas que se constroem sobre autores e movimentos, inclusive sobre suas vidas e suas idéias, pois elas acabam nos cegando para os textos.

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4 respostas a O Dualismo de Descartes

  1. adalberto disse:

    Concordo plenamente com suas considerações, João. Descartes não foi um tolo. A meu ver foi o primeiro neurocientista da humanidade. Nunca se falou tanto em pineal (entendida, por uns, como a epífise, e por outros, como a hipófise, tanto faz). As neuroimagens funcionais estão mostrando telas fantásticas, e a aceitação da espiritualidade vindas principalmente do Oriente falam por nós.

  2. João Mattar disse:

    Adalberto, eu ainda estou te devendo a formatação das coisas que falamos por fone, mas hoje dei uma aula sobre o Descartes. Gostaria muito de ter você em alguma aula ou então dentro do Blackboard, para conversar com os alunos. Você toparia? Senão, podemos fazer a brincadeira por aqui mesmo.

  3. adalberto disse:

    João, topo assim que puder. Acabo de pedir demissão da Anhembi. Este clima de incertezas polui a alma. Fui convidado para colaborar na estruturação da Faculdade de Medicina da São Camilo. Em meio a isso tudo estou em busca do meu prumo (que nem o Suplicy).

  4. João Mattar disse:

    Ich, então esquece. Eu estou então te devendo os textos dos nossos outros projetos. Te mando asap.

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