Durante o 13º Congresso Internacional da ABED, realizado em 2007 em Curitiba, o professor indiano Sugata Mitra, da Newcastle University, fez uma apresentação bastante interessante e aplaudida, daquelas que o nosso companheiro Valente tenho certeza vai adorar: “The Hole in the Wall: effects of remoteness and technology on children’s education“.
Ele mostrou algumas experiências que tem realizado com crianças na Índia, que é um país grande e que enfrenta problemas de distância de várias cidades pequenas em relação aos grandes centros. Além disso, os professores que são treinados no interior acabam migrando para as grandes cidades, em busca de posição melhor. O resultado disso é que a qualidade da educação é inversamente proporcional à distância em relação às grandes cidades.
Mitra afirmou que a tecnologia é sempre testada e utilizada com os alunos que possuem o nível social mais alto, mas esses alunos já possuiriam os melhores professores, portanto os mais carentes é que teriam maior necessidade de uso da tecnologia, com os quais ela deveria ser testada em primeiro lugar.
Nesse sentido, o professor Mitra defendeu que a aprendizagem é um sistema de auto-organização (em que uma estrutura surge sem intervenção explícita de fora do sistema, como o são os engarrafamentos, o mercado de ações, os movimentos sociais pós-desastres, etc., ou, do ponto de vista da tecnologia, o Second Life, ambientes wikis, Moodle, Bearshare etc.), e suas pesquisas demonstrariam isso. Em cidades pequenas ele tem instalado um computador no meio das ruas, e então começa a filmar a reação das crianças. Em pouco tempo, elas se tornam especialistas no uso do computador, dos softwares, em navegar pela Internet etc. Suas pesquisas têm o título genérico de “The Hole in the Wall”, e começaram em um local em que, de um lado de uma parede, havia especialistas em computação, e de outro crianças que não iam para a escola: ele então fez um buraco na parede e instalou um computador.
O que ele defende é que as crianças aprendem sozinhas e se ensinam a utilizar a Internet, através da interação. Aprender, para Mitra, é portanto um sistema de auto-organização. Ele citou o exemplo de uma das experiências onde ele se aproximou das crianças, três meses depois de que o computador havia sido colocado no local, e uma delas lhe disse: precisamos de um mouse melhor e um processador mais potente! As crianças aprenderam inclusive inglês, através do próprio computador; ou seja: a língua não foi uma barreira para elas aprenderem os jogos, elas se ensinam a si próprias.
Vejam alguns exemplos do trabalho do professor Mitra:
É importante notar que, nesses experimentos, o computador não está dentro da sala de aula, mas nas ruas. Agora, o professor Mitra está interessado em testar se as crianças podem aprender desta mesma maneira coisas como história, geografia etc., e não apenas a jogar games. E que tipo de design é possível desenvolver para esse tipo de aprendizado.
Isso é muito bom, porque realmente aproximar o processo de educação do ato de aprender sozinho a mexer na Internet e brincar com alguns games talvez seja um grande equívoco e uma extrema simplificação. Aliás, já andei dizendo por aqui que quando se fala de uso das novas tecnologias, muitas vezes se ressalta o entusiasmo dos jovens com elas, mas quase nunca se vai além disso, para reflexões propriamente pedagógicas, sobre como essas tecnologias podem ser utilizadas para além do prazer e lazer. E podemos ainda pensar que, num cenário com uma parede separando especialista em informática de crianças analfabetas que não vão à escola, haveria muitas outras mobilizações possíveis além de abrir um buraco na parede e filmar as reações das crianças na interação com o computador: os especialistas em informática poderiam passar a ensinar o que sabem (não apenas computação) para as crianças; a população mais desfavorecida poderia se rebelar e invadir a empresa; etc.
Ele lembrou ainda que as tecnologias utilizadas em educação nunca são desenvolvidas para a educação, mas são sempre emprestadas. Então, seria necessário desenvolver tecnologias voltadas especificamente para o ensino e a aprendizagem. Nesse sentido, ele tem trabalhado em um laboratório que desenvolve tecnologias para a educação.
Segundo o otimismo de Mitra, métodos de aprendizado por auto-organização poderiam atingir todas as crianças do mundo em menos de 10 anos, para as quais não há hoje professores suficientes, nem nunca haverá.
A palestra está também coberta (inclusive com cópias de slides) no blog coordenado pelo professor Wilson Azevedo.
Em 2012, Sugata Mitra esteve na Campus Party. Então, aqui vai uma palestra mais recente no TED:
Bastante instigante o trabalho do Professor Sumatra Mitra. Como educadora, quero fazer uma provocação: se sozinhas as crianças podem aprender tanta coisa, imaginem aonde elas podem chegar orientadas por educadores bem formados?
Lembrando, alguém teve q colocar o computador no buraco, e teve q avaliar o q e como as crianças aprenderam, e hoje alguém esta verificando outras possibilidades de aprendizagem. Será este o papel destinado ao professor? Que professor sera este? Ira dar aula em outro pais, longe de seu objeto de pesquisa?
Sinto falta ainda de uma complementação a esta pesquisa inicial do buraco e dos buracos. Que pesquisa complementar ao conceito proposto poderiamos fazer aqui no Brasil?
Tem ainda a apresentação do Mitra no Educared 2011 : http://mediateca.fundacion.telefonica.com/visor.asp?e7595-a15217
Breno, as experiências dele são sem dúvida muito interessantes, mas acho que há um exagero na expectativa de que a autoaprendizagem resolve todos os problemas da educação, de que as crianças aprendem sozinhas e pronto. Repare p.ex. que nem mesmo o Prensky, tão criticado pelo conceito de nativos digitais, diz isso.