A última Exame deste ano – edição 934, ano 42, número 25 – que está nas bancas, tem uma longa reportagem sobre a educação no Brasil, que vou resumir e comentar por aqui.
Desde 1996, tornou-se possível legalmente explorar o ensino superior com lucro no país. Em 1998 havia pouco mais de 2 milhões de matriculados em instituições de ensino no país, contra mais de 5 milhões de hoje. E esse crescimento ocorreu principalmente nas instituições privadas, que passaram de 1,3 milhões para 3,8 milhões de matrículas nesse período, e têm hoje 3/4 dos alunos do ensino superior em nosso país. O faturamento das instituições privadas de educação cresceu de 44 bilhões em 2002 para 55 bilhões em 2008 no Brasil, sendo 25 bilhões apenas no ensino superior.
Mesmo assim, há ainda bastante espaço para crescer, e estima-se um crescimento de pelo menos 5% nos próximos anos. No Brasil, apenas 20% da população que poderia estar na universidade faz um curso superior, enquanto os números de outros países são bem maiores: 43% no Chile, 61% na Argentina, 68% na Rússia, 82% nos Estados Unidos e 89% na Coréia do Sul.
Esse crescimento tem sido sustentado pela entrada de investidores financeiros no setor, que têm participado da modernização da estrutura das instituições de ensino e, por conseqüência, acirrado a competição, e também aumentado a oferta de financiamento para as mensalidades dos alunos, o que antes era restrito ao FIES. A reportagem cita alguns grupos que entraram no negócio da educação.
O Gávea Investimentos, um dos principais fundos de private equity no país, que tem como um dos sócios o ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, investiu na Ideal Invest, que oferece crédito a estudantes para financiamento de mensalidades e antecipa fluxo de caixa para IES. Os bancos Santander e Unibanco passaram também a oferecer financiamento para a graduação.
A Pátria Investimentos, gestora de recursos de terceiros, investiu na Anhanguera Educacional, fundada pelo professor Antônio Carbonari Netto em 1999, e que foi realizando várias aquisições até se tornar a primeira instituição de ensino a abrir o capital na Bovespa, em março de 2007.
A GP Investimentos, gestor de recursos de terceiros, investiu na Estácio Participações, que mantém a Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro, com mais de 200.000 alunos e faturamento anual de 1 bilhão de reais, que também já abriu seu capital na bolsa.
A Laureate International Universities, grupo americano que tem participação em uma rede de IESs ao redor do mundo, investiu na Universidade Anhembi Morumbi, Business School São Paulo, Esade – Escola Superior de Administração, Direito e Economia (RS), Universidade Potiguar (RN) e Centro Universitário UniNorte (AM).
O Pactual possui participação na faculdade FANOR, do Ceará.
O grupo Kroton Educacional, que tem como um dos sócios o ex-ministro Walfrido dos Mares Guia, dono das faculdades Pitágoras (MG) – que tem no seu conselho consultivo Cláudio de Moura Castro, também já abriu seu capital na bolsa.
A SEB – Sistema Educacional Brasileiro, que engloba dentre outras instituições as Faculdades COC, de Ribeirão Preto, e a Editora COC, seguiu o mesmo caminho.
Os valores captados na bolsa têm sido utilizados principalmente para aquisições, e atingimos recentemente no Brasil uma média anual de 72 vendas de faculdades. Além do crescimento esperado no setor e da tendência de consolidação das faculdades, ainda muito pulverizadas no país, esses grupos são atraídos pelo fato de boa parte das instituições de ensino privadas brasileiras ainda estarem sob controle familiar e serem ineficazes em práticas de gestão. Com as aquisições, esses grupos esperam ganhar em escala para compras de equipamentos e elaboração de materiais pedagógicos – e, aqui, corremos o risco do nosso ensino caminhar mais e mais para o modelo do impostutor, inclusive no ensino presencial, algo que preciso desenvolver mais por aqui.
Para os alunos, o resultado é a redução nos valores das mensalidades, o que tem possibilitado a maior participação de alunos de baixa renda no setor, 15% hoje, mais que o dobro do que em 2002. Temos hoje 2.425 instituições de ensino, sendo 2.162 privadas, oferecendo mais de 200 tipos de curso. A demanda não consegue ser suprida apenas com os investimentos do governo.
E parece que o setor da educação, assim como o da saúde, são mais resistentes aos efeitos da crise. As pessoas, ao contrário da tendência de contenção em outros gastos, precisam se capacitar ainda mais para enfrentar a concorrência maior.
Além disso, prevê-se que o Brasil terá nos próximos anos um déficit de engenheiros (como de petróleo, alimentos, computação, aeronáuticaa, materiais, civil, químicos e florestais), agrônomos, especialistas em tecnologia da informação, matemáticos, médicos geriatras, enfermeiros e administradores de empresas especializados em relações internacionais, dentre outras áreas. Como as empresas não podem depender da dinâmica do mercado da educação, crescem as universidades corporativas, o que também a reportagem da Exame aborda.
Assim, grandes grupos educacionais como Apollo (que já teve participação na Pitágoras e foi fundado em 1975 por Sterling, um professor universitário), Devry e Career começam a se interessar novamente pelo país. Ameaças? Um Projeto de Lei enviado pelo MEC e que tramita há 2 anos no Congresso, que pretende restringir a participação de grupos estrangeiros a 30% do capital das universidades brasileiras.
A reportagem discute ainda o caminho trilhado por países como Coréia do Sul, Irlanda, Finlândia e Chile para enfrentar seus problemas de educação, os baixos salários de nossos professores e a tendência acadêmica dos cursos superiores de pedagogia.
Enfim, bastante coisa para a nossa reflexão.
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Esta notícia saiu na Folha Online, semanas depois que escrevi este post: Ano letivo começa com crise em faculdades.
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Essa reportagem está on-line? você tem o link? Muito interessante. Estou escrevendo uma dissertação sobre o ensino superior privado do brasil, para o meu mestrado aqui em londres.
Pois é, Bernard, cheguei a procurá-la online quando estava escrevendo este post mas não encontrei. Tente procurar no site da Exame ou mesmo entrar em contato com eles, quem sabe eles enviam para você um arquivo em pdf. Se nada funcionar, me passe seu endereço que tiro uma cópia e envio para você.