Esta é uma questão que me angustia desde que li sobre o estado de fluxo em games.
É comum considerar que um dos objetivos da educação é desenvolver o senso crítico.
A experiência de fluxo (reli e resenhei nestes dias Flow: the psychology of optimal experience) seria compatível com o senso crítico? O senso crítico não pressupõe a capacidade de estar dentro e fora da experiência ao mesmo tempo? De múltiplas perspectivas? De ficar em dúvida? E o fluxo não pressupõe justamente o contrário?
Na semana passada lancei esta questão no nosso encontro no Second Life, no curso Educational Games and Simulations. O professor é o David Gibson, um dos editores de Games and Simulations in Online Learning, e autor do recém publicado Digital Simulations for Improving Education Learning Through Artificial Teaching Environments. Ele reconheceu a complexidade da pergunta porque também ficou em dúvida. Primeiro ensaiou uma resposta – não poderíamos super racionalizar o conceito de senso crítico, mas depois repensou que, sempre que falamos de senso crítico, pressupomos a capacidade de falarmos de nós mesmos, de nos enxergarmos. Ora, mas o conceito de flow, desenvolvido por Mihaly Csikszentmihalyi, pressupõe justamente a falta de consciência sobre o self.
Eu ainda pensei, durante a interessante conversa – mas falta de consciência sobre o self não significa impossibilidade de múltiplas perspectivas, de estar dentro e fora da experiência – apenas significa não enxergar o self. Mas parece que nem o Gibson gostou da reflexão. Consciência sobre o self, durante a experiência, parece fazer parte da noção de senso crítico.
Mas depois eu ainda pensei – ok, pode ser que durante a experiência de fluxo você não seja capaz de estar no estado de senso crítico, mas a experiência de fluxo pode ajudá-lo a desenvolver o senso crítico. Depois do fluxo, o self sai mais forte, mais complexo. E senso crítico não é um estado, mas uma capacidade. Então, passar pelo fluxo, mesmo que sem senso crítico, elevaria o nosso senso crítico.
Parece uma solução, mas e a idéia de que devemos atingir o fluxo em nossa vida, como um todo, um contínuo? Any guess?
Nossa, que insight! Muito bom!
Eu cheguei a escrever um artigo colocando o fluxo como característica dos jogos educacionais. Parece que os jogos educacionais são um reflexo do sistema educacional, ou seja, mais escolarização (schooling) do que educação (education).
Faz todo sentido dizer que os jogos verdadeiramente educacionais, que estimulam o senso crítico, não devam induzir a um estado de fluxo.
Acho que vale a pena repensar o fluxo. Será que uma atividade pode continuar sendo imersiva, com desafios e habilidades balanceados, mesmo se o indivíduo não perder a consciência do self?
Renato, acho que foi mesmo um insight, registrei o post com essa sensação. Confesso, entretanto, que nessas leituras que estou resenhando nestas últimas semanas, repensei um pouco o tema. Apesar de o jogador estar em estado de fluxo, quando joga, dentro do jogo é possível haver diversos estados, incluindo os estados meta, em que ocorre reflexão. Ou seja, pelas escolhas que o jogador tem, pelos possíveis movimentos de câmera e perspectiva, pelas diferentes fases etc., talvez seja possível pensar o senso crítico dentro do estado de fluxo. Ainda vou parar para desenvolver isso nos próximos dias.
Pingback: De Mattar » Blog Archive » Aula 03 (14/04) - Games em Educação no SL
Primeiramente gostaria de parabeniza-lo pelo blog… alem da excelencia das pesquisas a excelencia e generosidade no compartilhar… pena que so descobri agora…
Pesquisei no meu mestrado sobre a Ensino de dança, musica e experiência do fluxo (UNESP- Rio Claro SP) e sua questão me motivou a repensar minhas pesquisas atuais em processo sobre o fluxo… Obrigada, seu blog tem informações valiosas!!!