How Computer Games Help Children Learn

SHAFFER, David. How computer games help children learn. New York: Palgrave Macmillan, 2006. Resenha de João Mattar.

David Williamson Shaffer, Associate Professor of Learning Science na University of Wisconsin-Madison, desenvolve no livro o interessante conceito de “games epistêmicos” (epistemic games): mundos virtuais criados a partir de práticas profissionais, que desenvolvem o pensamento inovador. São games que ajudam os jogadores a aprender a pensar como engenheiros, planejadores urbanos, jornalistas, arquitetos e outros profissionais inovadores. Cf. o site Epistemic Games: building the future of education.

O curto Foreword: Seeing the Future, de James Paul Gee, é seguido da Introduction, onde epistemic frames (estruturas epistêmicas) são definidas como conjuntos de habilidades, conhecimentos, identidades, valores e epistemologia pelas quais profissionais enxergam o mundo de determinada perspectiva e pensam de maneira inovadora.

Cada capítulo analisa um game epistêmico, para exemplificar o conteúdo discutido.

Chapter 1. Epistemology: The Debating Game explora os conceitos de game e aprendizado, e como eles podem ser combinados. O game analisado é o RPG The Debating Game, em que os participantes assumem os papéis de debatedores e juízes.

Chapter 2. Knowledge: The Digital Zoo mostra como os computadores modificaram o que significa saber alguma coisa e o tipo de conhecimento necessário hoje. O game analisado é Digital Zoo, desenvolvido por Gina Svarovsky na Universidade de Wisconsin, em que os participantes atuam como engenheiros biomecânicos, aprendendo ciências e engenharia.

Chapter 3. Skills: Escher’s World mostra como os computadores permitem fazer mais do que sabemos fazer sozinhos, e portanto nos possibilitam aprender fazendo as coisas que os profissionais inovadores fazem. No game Escher’s World, desenvolvido pelo autor com a ajuda de colegas do MIT, os jogadores se tornam designer gráficos e aprendem matemática e geometria.

Chapter 4. Values: The Pandora Project mostra como games podem motivar adolescentes a desenvolver as habilidades, o conhecimento e as atitudes necessárias para se tornarem bem sucedidos hoje, em função do que os profissionais valorizam e consideram significativo. No Pandora Project, desenvolvido pelo autor com um grupo de pesquisadores da Universidade de Harvard, os jogadores tornam-se negociadores, aprendendo biologia, relações internacionais e mediação.

Chapter 5. Identity: Science.net explora o que significa ser um profissional inovador e como é possível os adolescentes se identificarem com profissionais, e, por consequência, se preparar para serem adultos bem sucedidos. No Science.net, desenvolvido por David Hatfield e Alecia Magnifico na Universidade de Wisconsin, os jogadores assumem o papel de jornalistas, aprendendo sobre ciências e seu impacto na sociedade, transformando-se em melhores escritores e se enxergando como profissionais inovadores.

O Chapter 6. The Future: Urban Science discute o uso de epistemic games em educação. Dois games sobre cidades são comparados: SimCity e Urban Science, desenvolvido por Kelly Beckett e Elizabeth Sowatzke, da Universidade de Wisconsin.

Epistemografia é definida como o olhar para os tipos de ações e os tipos de reflexões-em-ação que desenvolvem a epistemic frame (estrutura epistêmica) de uma profissão. Com os games epistêmicos, os jovens não precisariam esperar o ensino superior ou o mundo do trabalho para começarem sua educação para a inovação.

O capítulo explora o conceito de “terceiro lugar” (third place), de Ray Oldenburg, que apontaria para lugares como cafés, centros comunitários, lojas, clubes, acampamentos etc., onde as pessoas se encontram, discutem problemas e criam comunidades, livres das expectativas de casa e do trabalho. Games epistêmicos seriam um tipo de “terceiro lugar”, ou “terceiro espaço”, entre a educação formal e os games comerciais, a instrução formal e o livre divertimento, em que o foco é o aprendizado, não as forças mercadológicas dos games comerciais ou os imperativos institucionais das escolas de hoje. Eles podem, inclusive, ser jogados fora da escola, mesmo porque a escola de hoje não é um espaço ideal para inovação. Podem fazer parte dos “terceiros espaços virtuais”, conceito de Constance Steinkuehler, como o Second Life ou o Quest Atlantis.

Há então uma reflexão muito interessante, que se aproxima do conceito de Aututor que venho defendendo há algum tempo em EaD. Tem se tornado cada vez mais barato produzir um game, tanto que desenvolvedores de games como Eric Zimmerman têm defendido o conceito de indie games (desenvolvimento independente de games), assim como p.ex., no cinema, existem filmes independentes (cf. Do Independent Games Exist?).

Epistemic games, desenvolvidos nessa perspectiva, seriam alternativas políticas e financeiras para acelerar as mundanças na escola; podem ser desenvolvidos fora da escola, para uso fora da escola e para mostrar o que pode significar pensar fora da escola. Sabemos que o que os alunos aprendem na escola não é transferido para o mundo real com facilidade, que existe um abismo entre, de um lado, os fatos e as regras que os alunos memorizam para as provas nas escolas, e, de outro lado, o aprendizado que eles precisam utilizar para resolver problemas reais. Nos games epistêmicos não existe essa desconexão, pois em vez de aprender fatos, informações e teorias primeiro, e depois tentar aplicá-los, os fatos, as informações e as teorias são aprendidos e lembrados porque foram necessários para jogar o jogo – ou seja, para resolver algum problema do mundo real, em primeiro lugar. A principal mudança gerada com o uso de games epistêmicos, portanto, seria pararmos de pensar que o objetivo principal da escola é ensinar matemática, ciências ou estudos sociais. Games permitem criar mundos virtuais em que podemos pensar de maneiras diferentes. Para Shaffer, eles representam uma mudança no mesno nível das mudanças geradas com a linguagem, a escrita e a imprensa. Eles desenvolvem uma maneira profissional e prática de ver, pensar e atuar em problemas importantes, refletindo com a ajuda de colegas. Eles tornam possível nos movermos para além de disciplinas derivadas do conhecimento medieval e ensinadas em escolas programadas para a Revolução Industrial.

Notes, Bibliography, Index e Acknowledgments encerram o livro.

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