O Diálogo do Cavalo Branco

Este diálogo é atribuído a Gongsun Longzi, filósofo chinês que viveu entre os séculos III e IV a.C. Ele é representante dos Lógicos ou da “Escola dos Nomes”, uma das escolas da Idade de Ouro da filosofia chinesa, em que debatiam as chamadas “Cem Escolas do Pensamento”, dentre as quais se destacaram o confucionismo e o taoísmo.

A tradução está baseada na adaptação para o inglês de Bryan W. Van Norden, que tem introdução e notas.

A

Um cavalo branco pode não ser um cavalo?

Defensor: Sim.

Opositor: Como?

Defensor: “Cavalo” é aquilo por meio do qual nomeamos uma forma. “Branco” é aquilo por meio do qual nomeamos uma cor. O que nomeia uma cor não é o que nomeia uma forma. Por isso, digo que um cavalo branco não é um cavalo.

B

Opositor: Se existem cavalos brancos, não se pode dizer que não existam cavalos. Se não se pode dizer que não existam cavalos, isso não quer dizer que existem cavalos? Pois haver cavalos brancos implica haver cavalos. Como os brancos poderiam não ser cavalos?

Defensor: Se alguém quer um cavalo, isso se estende a um cavalo amarelo ou preto. Mas se alguém quiser um cavalo branco, isso não se estende a um cavalo amarelo ou preto. Suponha que um cavalo branco seja um cavalo. Então o que se quer [nos dois casos] seria o mesmo. Se o que se quer é o mesmo, então um [cavalo] branco não diferiria de um cavalo. Se o que se quer não difere, então como pode ser que um cavalo amarelo ou preto é por vezes aceitável, e por vezes inaceitável? É claro que aceitável e inaceitável são mutuamente contrários. Assim, cavalos amarelos e pretos são os mesmos [em que, se houver cavalos amarelos ou pretos], pode-se responder que existem cavalos, mas não se pode responder que existam cavalos brancos. Assim, é evidente que um cavalo branco não é um cavalo.

C

Opositor: Você considera que os cavalos que são coloridos não são cavalos. No mundo, não existem cavalos sem cor. Será que não existem cavalos no mundo?

Defensor: Cavalos certamente têm cor. Portanto, existem cavalos brancos. Se cavalos não tivessem cor, haveria simplesmente cavalos, então como alguém poderia escolher um cavalo branco? Um cavalo branco é um cavalo e branco. Um cavalo e um cavalo branco [são diferentes]. Por isso, digo que um cavalo branco não é um cavalo.

D

Defensor: “Cavalo” ainda não combinado com “branco” é cavalo. “Branco” ainda não combinado com “cavalo” é branco. Quando combinamos “cavalo” e “branco”, usamos a expressão composta “cavalo branco”. Trata-se de tomar o que não é combinado e combiná-los como uma frase. Por isso, eu digo que não é possível que um cavalo branco não seja um cavalo.

Opositor: Você acha que existirem cavalos brancos significa existirem cavalos. É aceitável dizer que existirem cavalos brancos significa existirem cavalos amarelos?

Defensor: Não é aceitável.

Opositor: Se você acha que existirem cavalos é diferente de existirem cavalos amarelos, isso significa que cavalos amarelos são diferentes de cavalos. Se você diferencia cavalos amarelos de cavalos, devemos pensar que cavalos amarelos não são cavalos. Pensar que cavalos amarelos não são cavalos, mas pensar que cavalos brancos são cavalos, isto é virar as coisas de cabeça para baixo e do avesso! Esta é a doutrina mais incoerente e o discurso mais confuso no mundo!

E

Opositor: Se existem cavalos brancos, não se pode dizer que não existam cavalos, por causa do que é chamado de “separabilidade do branco.” Apenas para aquelas pessoas que não separam, ter um cavalo branco pode não implicar ter um cavalo. Então, a razão pela qual consideramos que há cavalos é apenas porque consideramos que “cavalo” significa “há cavalos”. Não é que consideramos que “há cavalos brancos” significa “há cavalos.” Daí, porque há cavalos, não se pode dizer que um cavalo [branco] [não é] um cavalo.

Defensor: “Branco” não fixa o que é branco; ignora-o. A expressão “cavalo branco” fixa o que é branco. O que fixa o que é branco não é o branco. “Cavalo” é indiferente a cor. Assim, [se você estivesse apenas procurando um cavalo] um cavalo amarelo ou preto seria apropriado. “Cavalo Branco” seleciona pela cor. Então [se você estivesse procurando um cavalo branco] um cavalo amarelo ou preto seria rejeitado por causa da sua cor. Assim, somente um cavalo branco seria apropriado. O que não rejeita não é o que rejeita. Por isso, digo que um cavalo branco não é um cavalo.

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Uma resposta a O Diálogo do Cavalo Branco

  1. EDUARDO BANKS disse:

    Isso é Hegel, só que na China do Século IV da Era Comum. A disputa sobre o “cavalo branco” ser ou não ser um cavalo reporta ao ABSOLUTO, na forma das tríades da filosofia hegeliana.

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