Faleceu ontem meu querido mestre de violão (e da vida) Henrique Pinto. Uma notícia muito triste, só compensada pelo fato de que ele vinha sofrendo há bastante tempo.
Ele é considerado uma referência e um líder no movimento e nos estudos de violão clássico no Brasil. Usei muitos de seus métodos e transcrições (estes não são todos), mesmo antes de ter aula com ele.
Tive aula com ele em diferentes momentos da minha vida, desde os anos 80. Tenho vivas na minha memória muitas dessas aulas, a chegada ao seu apartamento, a pequena espera, as conversas, ele pegando o violão e tocando, as dicas, as partituras, a vontade de retornar logo para casa e tocar uma música nova etc. Foi com ele, por exemplo, que tirei muita coisa do Villa-Lobos. Foi ele também quem me incentivou a dar concertos e participar de concursos e festivais. Com o apoio dele, também, surgiu o Quarteto de Violões de São Paulo (eu, Breno Chaves, Roberto Capocchi e Eduardo Fleury), hoje Quarteto Quaternaglia. O violão que tenho até hoje, do Sérgio Abreu, comprei dele.
Mas mais do que violão, aprendi muito com ele sobre muitas outras coisas. Lembro sempre de uma frase (que não conseguirei repetir ao pé da letra) que ele me disse uma vez, durante uma aula: “Tudo o que levamos anos para construir com muito esforço, pedra a pedra, tijolo a tijolo, pode ruir em um rápido instante.” Ele era uma pessoa simples e adorável, um grande papo, uma pessoa que eu admirava demais, um ídolo para mim.
Deixo aqui minha singela homenagem. Gostaria de ter estado com você nestes momentos finais. Vá com Deus, meu querido orientador e mestre!
Palavras lindas de outro grande violonista, Fabio Zanon:
“Este é o Annus Horribilis do violão. Não consigo nem manifestar o que estou sentindo, está passando um filme em replay na minha cabeça. Eu conhecia o Henrique desde 1982, estudei com ele e, sem contar todo o ensino, foi das pessoas que mais me puseram pilha para levar o violão a fundo. Quem foi seu aluno sabe, sem interferir de forma ostensiva na vida de seus alunos ele dava conselhos que só um pai muito desvelado e sábio poderia dar. Tinha respeito por gente que tinha 1/4 da idade dele. E foi, sem sombra de dúvida, a figura mais influente do violão clássico no Brasil nos últimos 40 anos. Se o Brasil toca violão desse jeito, deve muito ao Henrique. Que desolação, ficamos todos órfãos.”
Lutier Sérgio Abreu:
“Lamento profundamente o falecimento de meu grande amigo Henrique Pinto, após longa enfermidade. Conheci o Henrique quando eu e meu irmão Eduardo tocamos pela primeira vez em S. Paulo, em 1966. Eu tinha então 18 anos e o Henrique menos de 25. Poucos meses depois ele nos visitou no RIo de Janeiro e a partir daí nossa amizade se desenvolveu rapidamente. Compartilhávamos frequentemente nossas idéias, nossos projetos, e não me lembro de um único recital nosso em S. Paulo ao qual ele não tenha comparecido, nos dando sempre todo o apoio possível na divulgação de cada evento. Quando decidi trocar as salas de concerto pela lutheria ele e meu pai foram meus primeiros e maiores estimuladores em todos os sentidos.
Durante nossa longa convivência acompanhei fascinado o crescimento de suas habilidades e de seu prestígio como professor e segui o desenvolvimento de inúmeros alunos seus em quem ele soube despertar o amor e o entusiasmo pela música ao mesmo tempo em que conseguia um desenvolvimento técnico certeiro e do mais alto nível. Por suas mãos passaram praticamente todos os grandes violonistas brasileiros a partir da década de 1970. Sua dedicação aos alunos não tinha limites e, além das longas e extenuantes jornadas diárias de aulas, ele ainda encontrava tempo e disposição para realizar cursos pelo país inteiro, organizar festivais, concursos e seminários, muitos dos quais marcaram época. Sua energia era surpreendente e aparentemente insgotável.
Juntos fomos a grandes concertos, por exemplo me lembro que assistimos ao último e memorável recital em S. Paulo de Alicia de Larrocha, na Cultura artística. Agora guardo na lembrança com carinho sua última visita ao Rio de Janeiro, há exatamente um ano, quando ele veio apanhar mais um violão que eu havia construído para ele com minhas melhores madeiras. Sempre que nos encontrávamos ríamos muitos, gostávamos de trocar piadas e fazer comentários engraçados. Infelizmente o momento agora é da mais profunda tristesa. Envio aqui minhas condolências a todos os seus familiares, e especialmente a sua filha Érika, minha querida afilhada de batismo.”
Muito bonitas também as palavras de Miguel De Laet. É muito bonito perceber que muitos sentiam a mesma coisa, e o tinham como um verdadeiro mestre.
Por fim, uma homenagem em imagem que recebi por email, do Thiago Fratuce:
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O professor Henrique Pinto fica eternizado através dos seus métodos, do seu legado para o violão e pela sua crença em relação à sua metodologia de ensino. Obrigado Mestre, por me ter dado a oportunidade de aprender com você. Fica uma grande lacuna na didática do violão erudito. Sentirei saudades das nossas aulas e das nossas conversas!!! Obrigado por tudo!!! Seu aluno,
Marcello Tibiriçá Toscano.
Fazia tudo com muito amor, o seu incentivo e dedicação para com todo aluno era constante não importando se fossemos virar concertistas,professores de violão ou apenas amantes da música,e a cada conquista nossa ficava tão orgulhoso como o pai fica pelo filho.
Dizia sempre que cada aluno é único,tem seu próprio ritmo de aprendizagem e com toda paciencia do mundo levava isto ao pé da letra.
Meu querido Mestre e amigo, sentirei muita saudades.
Marcio Alexandre Alves
Graças ao mestre Henrique Pinto pude me formar como Bacharel em Instrumento pela faculdade de Música de Santos em 1982. Na época eu fazia o Bacharelado em Composição e Regência com grandes aves raras como o compositor Gilberto Mendes, o maestro Tabarim, o professor Breno Braga, o maestro Paul Bernard. Quando souberam que eu estudava com o professor Henrique Pinto em São Paulo logo a direção da Faculdade me convidou para fazer o curso de Bacharelado em Instrumento contratando o mestre Henrique Pinto. Na época fiquei surpreso com o convite, achei que o mestre, devido a sua vida atribulada, não tivesse tempo para assumir tal compromisso. Mas para a minha surpresa tive essa felicidade que muito me orgulho e me honra.
Ao mestre de meu professor Acacio Oliveira, minha singela homenagem.
Na década de 70, não me recordo muito bem o ano, fui a um recital no Masp assistir o Henrique Pinto em duo com o flautista Sagar, parece hoje, tal a lembrança. Um repertório cameristico de altíssima qualidade e execução primorosa dos solistas. Ainda, nessa época eu não estava envolvido com musica erudita da capital. Quando eu participei como bolsista do festival de Campos do Jordão em 1977 tive o primeiro contato com alguns alunos do Henrique, daquele momento em diante eu vi a possibilidade de ter aulas com o mestre. Apartir de 1978, eu degustei da melhor e mais saborosa orientação violonistica. Foram 10 anos sob orientação do Henrique. Praticamente todo o meu repertório foi reformulado, orientado e acompanhado por ele. Recordo que em 1987 quando consegui, o sonhado contrato de concerto para os EUA, CA e lembro até hoje a satisfação do maestro em trabalhar o concerto em fá maior de Karl Kohaut para violão e orquestra de camara, que ele sugeriu, em São Francisco – CA. Quando retornei ao Brasil, cheio de Henrique, trouxe um cheque-mate ao maestro. Contrato para retornar novamente em 1988 para EUA, desta vez para tocar o Concierto de Aranjuez de J. Rodrigo. Foi um grande desafio para o meu trabalho como instrumentista e o otimismo, incentivo e a credibilidade do Henrique em trabalhar a obra comigo em apenas 6 meses. Confidente de seus problemas pessoais, amigo de piadas, de refeições em restaurantes e em minha casa, de festivais, do café na escola, ciclos e seminários, de criticas e homenagens, Luthies e professores, métodos e transcrições, do dedilhado certeiro, do melhor som e melhor ataque, da maior e melhor concentração de violonistas do Brasil, assim posso dizer, vai ser impossível deixar de lembra-lo. Hoje, levo o meu trabalho violonistico pelos quatro cantos do mundo com a absoluta certeza da riqueza herdada. Infelizmente ficou um “hiato” irrecuperável ao mundo do violão brasileiro. Eu externo o meu pesar e sentimento de profunda tristeza a seus familiares e …muito obrigado maestro pelo oficio “violonista”.
Acácio Oliveira
Lindas suas palavras, Acácio, realmente ele foi uma pessoa fantástica, muito além do violão. Felicidades e um excelente 2011 para você!
Um professor acima de tudo, sabia como passar as informações que de nós estudantes de violão, pudessimos visualizar sem a sua ajuda, foi uma perda irreparavel.