Hoje tivemos a primeira rodada do Encontro de Professores de EaD durante o 8º SENAED – Seminário Nacional ABED de Educação a Distância. A ideia de hoje era fazer um brainstorm para que os participantes explicitassem as suas posições, visando à produção de um documento na segunda parte do Encontro, amanhã. Vou então tentar resumir e comentar por aqui algumas ideias e posições, sem mencionar nomes.
Comecei apresentando o cronograma da mobilização Tutor é Professor para este ano e a proposta de redação para a Carta de Campinas. Um dos pontos retomado foi a importância da discussão sobre modelos de EaD, que impactam diretamente na relação de trabalho do professor. Em muitos modelos conteudistas, o professor está identificado com a produção de conteúdo e o tutor com a mediação, ou mesmo a mera função passiva de “atender” alunos.
Foi lembrado que o professor Wilson Azevedo já conduziu, há alguns anos, um Encontro de Tutores em EaD, assim como o professor Enilton Rocha conduziu um Encontro de Professores em EaD, ambos em eventos da ABED.
Parece haver um consenso em relação ao problema da tutoria na UAB – o fato de o tutor receber uma remuneração muito ruim por seu trabalho; o fato de não ser contratado; o fato de receber uma bolsa (e não salário); de não ter direitos trabalhistas; o fato de não realizar pequisa (quando deveria realizar), o que caracterizaria uma relação de trabalho; a volatilidade de sua atuação, transitória apenas, sem vinculação com a instituição etc. Alguma coisa específica em relação à UAB deverá entrar no documento de amanhã.
Há uma questão interessante em relação à definição dos termos professor e tutor. Consegui identificar duas propostas de diferenciação dos dois conceitos:
a) Professor dá aula no presencial e tutor atua na EaD. Se tendemos a um cenário em que essas distinções presencial/distância não estarão mais tão claras, esta diferenciação parece que se perde; de qualquer maneira, é nessa diferenciação que a campanha Tutor é Professor deseja atuar – justamente porque a diferenciação tem possibilitado a contratação de tutores – ou instrutores – de maneira a excluir o profissional da jurisdição dos sindicatos de professores, a contratação por bolsas – como ocorre na UAB etc. Nesse sentido, parece essencial, como já foi discutido no Encontro em Campinas, voltar à legislação do MEC para avaliar como a diferenciação está redigida, procurando num segundo momento alterá-la.
b) Professor está vinculado ao ensino acadêmico, tutor a cursos livres e/ou corporativos. Assim, o tutor poderia, eventualmente, ser um professor. Nesse sentido, a batalha seria pelo reconhecimento do tutor como professor apenas no ensino superior ou médio (que tende a crescer), mas não no caso de cursos livres ou no ensino corporativo. Precisamos discutir um pouco mais como esses professores de cursos livres e corporativos (quando são oferecidos de forma presencial) são tratados, do ponto de vista de legislação etc. Desde que o profissional exerça uma função docente, ele é um professor, deve ser registrado pela CLT, tem assistência do Sindicato etc. Portanto, não faria sentido por causa da EaD defender uma bandeira contrária. Posicionar-se se um professor deve ou não ter relação trabalhista com uma empresa não é objetivo do nosso documento, mas defender que um professor de educação a distância não deve ser tratado como um instrutor ou tutor, para justamente não ter direito aos benefícios do professor em convenções coletivas, do apoio do sindicato etc. – isso sim deve fazer parte do nosso documento.
c) Professor tem necessariamente formação, tutor não. Assim, num curso que não exigisse formação, poderíamos ter um tutor atuando, que no caso não seria professor. Na verdade, nesses casos, quando o curso é presencial, chamamos também de professor, e (como no item acima), ele tem direito a registro pela CLT, apoio do sindicato etc.
Um tutor passa por concurso, prova escrita, entrevista, prova prática etc. e em muitos casos pede-se titulação de mestre ou doutor. Portanto, ele é um professor.
Foi levantado também que um tutor (em muitos casos) não trabalha efetivamente como um professor, o que ele faz não é uma tarefa de professor. Por isso, não deveríamos considerar o tutor como professor. Foi dado o exemplo de que o tutor muitas vezes responde simplesmente que a atividade está boa e ponto. Parece-me haver uma falácia neste argumento. Em primeiro lugar, no presencial há também professores que trabalham mal – isso não se resolve com o reconhecimento de que a classe não existe. Além disso, muitas vezes essa atuação do tutor pode ser justificada pelo modelo em que ele está inserido, engessado, com uma baixíssima remuneração etc. O fato de alguns tutores trabalharem mal não pode ser considerado justificativa para não reconhecer seu trabalho como docente.
Não teríamos então aqui uma nova profissão, que precisa ser regulamentada, mas um novo tipo de trabalho docente, que precisa de uma formação específica e um tratamento diferenciado.
Foi mencionada uma instituição em que os professores que trabalham com EaD, além do salário normal de um professor presencial, têm um adicional por trabalharem à distância. Esta pode ser então uma bandeira e entrar no nosso texto de amanhã.
Foi levantada também a questão do número de alunos que um tutor atende em EaD – este deve ser um ponto do documento de amanhã, assim como a questão da remuneração do trabalho docente na EaD.
Falou-se bastante na atuação dos sindicatos. Alguns reclamaram que os sindicatos já foram chamados a participar das discussões, mas se recusaram. Eu registrei que minha aproximação com os sindicatos, especificamente em relação a esta questão da tutoria, tem sido extremamente produtiva. Penso também que no documento de amanhã, devamos incluir alguma coisa sobre a atuação dos sindicatos.
Um comentário importante, que precisa ser levado em consideração em toda a mobilização e discussão: quem está trabalhando como tutor precisa trabalhar para sobreviver, ou seja, o movimento não pode prejudicar a situação de vida desse profissional, mas, ao contrário, deve servir para melhorá-la. Isso inclusive explica a falta de coragem de muitos tutores virem a público denunciar sua condição de trabalho.
Parece-me essencial também reconhecer que todos nós, professores, tutores, pesquisadores etc. consideramos que precisamos ter voz no desenvolvimento de políticas públicas para a EaD, principalmente na definição dessas funções docentes. Queremos construir um projeto de EaD para o país, não simplesmente obededer um projeto que vem de cima para baixo.
Gostaria também de ressaltar a presença e participação maciça de professores da UFPB Virtual, que mesmo quando desempenham a função de tutoria, se autodenominavam professores.
Comentário gerais e interessantes que foram feitos, mesmo que não devam aparecer no documento de amanhã:
a) a situação que vivemos da tutoria no Brasil explica-se, pelo menos em parte, pelo processo de migração do trabalho escravo para o trabalho livre pelo qual passou nosso país;
b) a palavra tutor faz sentido na Inglaterra, onde ele faz tudo, mas foi importada de maneira equivocada para o Brasil;
c) pode-se pensar na dialética autor/tutor como no caso do teatro – em uma peça o ator é o principal, e outra o coadjuvante, ou seja, em um momento o professor pode desempenhar a função de conteudista, em outra de professor a distância etc.
Qualquer comentário que você fizer por aqui é precioso. Amanhã à tarde teremos um grande desafio de elaborar um documento escrito, e suas ideias serão levadas em consideração.