A Tecnologia e a nossa Mente

Gary Small, neurocientista da UCLA, e sua esposa Gigi Vorgan, atriz e escritora de televisão, publicaram recentemente iBrain: Surviving the Technological Alteration of the Modern Mind. O livro mostra como o uso da tecnologia, pelas gerações mais novas, altera suas relações sociais e inclusive suas mentes.

Em Online Literacy is a Lesser Kind: slow reading counterbalances web skimming, um artigo disponível apenas para assinantes do Chronicle of Higher Education (que assinei por 1 ano recentemente), Mark Bauerlein desenvolve uma discussão similar, defendendo a necessidade de espaços para ler e escrever mais lentamente (slow-reading e slow-writing). Os educadores precisariam preservar parte da experiência do estudo desconectada, desplugada e deslogada. Lápis, lousas e livros não são mais os principais instrumentos de aprendizado, mas eles ainda desempenham um papel crítico na formação da inteligência, como contraponto à velocidade da informação digital. Essa seria uma nova missão dos educadores, que pode parecer reacionária e retrógrada, mas que na verdade serviria para manter as mentes dos estudantes abertas. Os alunos precisam desacelerar, e eles não conseguem fazer isso por conta própria. Parece-me um pouco estranha essa idéia de que o educador deva ser o guardião da relação do jovem com a tecnologia, porque ele não teria condições, sozinho, de dosá-la.

No longo Brave New World of Digital Intimacy, Clive Thompson discute o conceito de intimidade digital. A seguir, resumo alguns dos pontos principais do artigo.

Em 2006, 2 anos depois de fundar o Facebook, Mark Zuckerberg introduziu o News Feed, um serviço (que hoje encontramos também no Orkut) que passou a mostrar as alterações nas páginas dos nossos amigos virtuais. No início, houve muito protesto porque a intimidade dos participantes do Facebook estaria sendo quebrada, então logo foi introduzida uma opção para deixar as alterações na sua página privadas. Mas a resistência logo foi superada pela oportunidade de se sentir mais ligado aos amigos.

Essa sensação pode ser chamada de ambient awareness ou online awareness, algo que passou a ser experimentado também, por exemplo, em ferramentas de microblogging, como o Twitter. Com essas ferramentas, podemos hoje sentir o ritmo da vida de vários de nossos amigos, o que antes não era possível. Depois, quando encontramos nossos amigos cara-a-cara, parece que não estivemos tão distantes deles.

Esse é um fenômeno difícil de compreender se você não o experiencia. Olhar o perfil de alguém no Facebook ou dar uma olhadinha no Twitter de outra pessoa não funciona.

Mas muitos perguntam: como é possível acompanhar a vida de tantas pessoas? Acontece que essas ferramentas não são tão exigentes, do ponto de vista cognitivo, quanto um e-mail. Em geral, você precisa abrir um email, parar e dedicar boa parte da sua atenção a ele, pois ele está direcionado a você, pedindo uma resposta ou uma solução. Já as mensagens no Facebook ou Twitter não são direcionadas para você. Assim, você pode decidir lê-las ou não, e passar rapidamente por elas, como no caso de manchetes de jornais.

Essas ferramentas criaram o que podemos chamar de weak ties – laços fracos. Muitas pessoas mantêm inclusive duas contas separadas – uma para os laços mais fortes, familiares etc., e outra para os laços fracos.

Mas essa profusão de laços fracos pode também se tornar um problema. Você pode gastar energia demais com eles, restando então menos energia para as relações pessoais verdadeiras, mas íntimas. Você tem agora mais amigos, mas dedica menos atenção e energia a cada um deles. Seguir nossos amigos online pode também nos tornar preguiçosos para visitá-los pessoalmente.

No início da Internet, dizia-se que podíamos milagrosamente reinventar a nossa identidade. Hoje, ao contrário, podemos dizer que assistimos a uma limitação da nossa identidade, já que todo mundo pode nos seguir, falar de nós publicamente, disponibilizar fotos e vídeos em que aparecemos etc.

De outro lado, o fato de pararmos mais de uma vez ao dia para registrar como nos sentimos, e observar o que os outros têm a dizer sobre nós, acaba funcionando como um tipo de auto-análise, um exercício filosófico e psicológico que pode ter um efeito positivo.

***

Esses textos mostram que há diversas perspectivas, muitas vezes bastante opostas, com que o uso da tecnologia pode ser estudado, psicológica e socialmente. Não vou fazer aqui nenhum tipo de fechamento. No meu Filosofia da Computação e da Informação, que faz tempo está na chapa mas acho que em 2009 finalmente sai, discuto todos esses pontos em detalhes. Ficam lançadas essas várias leituras para vocês, como alimento para as reflexões e discussões.

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